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Nos sábados de
aleluia, os garotos e adolescentes amanheciam numa expectativa nervosa, era
tradição, todos cresceram com o movimento do “romper da aleluia”. Às nove horas o sino da igreja, e o da estação
ferroviária auxiliados pelas sinetas
começavam a tocar juntos, acompanhados pelos repiques dos martelos nos trilhos,
as varetas nas latas e em tudo onde pudesse ser retirado algum tipo de som ,
por alguns minutos dominavam a atenção
do povoado, provocando uma emoção besta para uns, mas na verdade inesquecível
para muitos. Depois era só esperar pela movimentação até a queima do traidor, quando
as “bombas” nas entranhas do infeliz
começavam a explodir, pela vibração do povo parecia se tratar de uma execução real, mas não, era
a fé , o amor em Cristo que fazia qualquer um querer ser o carrasco, o vingador
do filho de Deus.
No mês de setembro,Jonas nunca
perdia o seu lugar na fila do caruru
de D. Gilmara, seria exagero dizer que ele era feito para todo povoado, mas que uma parcela importante dos seus
habitantes pegavam a direção da rua de cima , isso pode se garantir. Quando o
casal partia, fazia uma falta enorme a muita gente. Jonas sentiu muito a falta
do “baleiro”, o seu grito já fazia
parte da rotina do Vale do Ararí.
Outro acontecimento importante na vida daquela garotada, era a presença
do vendedor de “tabocas”. Um dia,
quebrando o silêncio do povoado o toque de um triângulo provocou um
levantar de cabeças, de gente e de bichos, carneiros que pastavam do lado do
curral de ferro, dois cachorros que dormiam nas cinzas onde há alguns dias Seu
José queimou plantas secas de “fedegoso”,
arrancadas porque fechavam o caminho da estação ferroviária. D. Alzira que ‘’estendia” roupas, virou a cabeça,
Mauro que ia puxando seu cavalo para amarrar no poste arqueou as
sobrancelhas, e os meninos pararam as brincadeiras. Pela entrada do povoado ,
vindo pelo lado da casa de Seu Maneca do
Jacú, uma figura desconhecida carregando um latão nas costas tocava um
triângulo e gritava:
------Taboca aaa!!!
E assim por muito tempo, todas as sextas feiras ele aparecia, vinha de
Barra do Alegrete , de trem até Taipóca
e de lá se introduzia pelo campo, passando por vilas, pelas moradias
isoladas no meio da mata. Do Vale pegava o trem
“mochila” e voltava pra casa.
O
vendedor de tabocas deve ter comentado o seu sucesso e assim fez surgir às segundas feiras , vindo da
mesma procedência, o vendedor de “quebra-queixos”,
aquelas paragens parecia mesmo ser uma fonte de renda para os estranhos
comerciantes ambulantes, e assim com uma tabuleiro de flandre na cabeça e um cavalete
pendurado no ombro e o apelo:
-----Olha o “quebra-queixo” ! quem vai querer?!
O pensamento de Jonas futuca todos os cantos da sua
infância, desembrulha fatos, ressuscita personagens
marcantes, revive figuras relevantes, como
por exemplo a de Seo Manoel do Ouro, joalheiro ambulante, carregando uma pasta
surrada. Foi na mão dele que sua mãe comprou seu
primeiro relógio, poucos garotos da sua idade possuíam igual. Tonho preferiu
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uma corrente com
uma medalha de Santo Antônio de porcelana contornada com um aro fino de ouro.
Seo Manoel era uma figura que até merecia
virar nome de rua, com seu chapéu “panamá” e um paletó cinza-azulado sem combinar
com as calças, Seu Manoel aparecia
quando ninguém esperava, por um bom tempo até fixou residência no Vale, mas não
ficava por ali, era um viajante perseguindo compradores.
Outra
época em que os pensamentos de Jonas
sempre desembarca é a junina. Em meados
de maio a professora começava a
organizar a quadrilha, era preciso tempo para que os alunos assimilassem as
novidades, partes novas que Suleide conheceu em Lagoinha. A garotada começava a
viver uma emoção que só terminaria depois do dia de São Pedro.
---Dino
viajou pra buscar fogos.
----Será
que ele chega hoje no trem mochila?
A
ansiedade só terminava quando o vendedor de todos os anos desembarcava na
plataforma. Só em olhar as caixas coloridas dos traques , adrianinos e
pistolas, era uma alegria indescritível.
----Seu
Dino, quanto custa uma caixa de adrianino de lágrimas?
----oito conto,
mas não é coisa pra sua idade não.
----Meu
pai segura na minha mão, vou ver se ele compra.
Na véspera de
São João o povoado exalava felicidade,
as ruas e becos se enfeitavam de bandeirolas, como não havia energia elétrica a
quadrilha era encenada as quatro da
tarde. Quando começava a escurecer as fogueiras
iam sendo acesas. Em pouco tempo o povoado se enxergava e se aquecia nas chamas
daqueles feixes de madeira. A garotada ficava por perto esperando um “tição” pra começar a queimar os fogos.
Os menores se conformavam com os traques de massa e os fósforos de cor. Os foguetes de lágrimas espocavam e de quanto
mais longe se observava maior a admiração. Lá pra dez horas as ruas e becos já
exibiam bêbados caídos pelos passeios, nas gramas, misturados com cascas de
laranjas e amendoins. Uma vez Lourinho quase caiu dentro da fogueira, foi salvo
por um bêbado mais equilibrado que embora trocando as pernas saiu se orgulhando
do seu feito.
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. Da estação
infância Jonas desembarca na estação “agora”,
está só no Recanto, sente falta de Rita, e as amoras colhidas são
guardadas com cuidado e será a primeira coisa a ser exibida quando voltar para
a cidade. Quando sua esposa está
no sitio, a tarefa de colher amoras é
dela, Jonas só não sabe, se ela também tem um trem viajando pelo tempo levando
seus pensamentos.
A solidão produz uma
angústia que aperta seu peito, então é melhor apitar, mandar o trem partir,
mudar seus pensamentos.
A viagem para
na estação “adolescência” ,
exatamente quando o coração começa a se envolver, com a visão focada nas raras
garotas, escondidas nos afazeres comum à vida daquele povo pobre. O povoado
sempre parecia deserto, com um
silêncio regular como uma máquina, cada
dia semelhante ao outro.
Como um detetive
espreitando seu alvo, Jonas vislumbra uma figura surgir no início da rua. De
banho tomado, penteado molhado, saia mais ou menos justa, passos elegantes
sobre a passarela de cascalho vermelho. Rosa agora fazia jus ao nome, depois de
trabalhar com a família o dia todo na casa de farinha. Ele embora filho do
homem do correio, não ligava para as filhas do farmacêutico ou do dono da
padaria. Não eram metidas, mas depois das férias pegavam o trem das quatro e
iam para cidade grande, e ele ficava
ali, como também
ficava Rosa. Mas... e se Rosa resolvesse um dia pegar o trem das quatro ? seu coração acelerava só de pensar, e quase
para, quando a viu subindo a plataforma de sacola na mão. Se aproximou e
observou ela comprando uma passagem de segunda classe para Lagoinha. Como
estava indo no trem das sete, torcia para que retornasse nos das dez, viagem
rápida que muitos faziam para tratar de negócios, compras ou até mesmo fazer
consulta com médico ou dentista. O trem partiu, e lá na curva do pontilhão
grande apitou, um apito meio triste aos ouvidos de Jonas, agravando ainda mais
aquele sentimento de falta. Rondando a estação ferroviária, ficou das sete às
dez horas, esperando, e ali pensou em várias maneiras de se declarar a Rosa, e
se condenava, se tivesse feito isso, saberia de tudo da sua vida, e quem sabe
essa viagem nem acontecesse, ou teria ido junto. Pôr fim, o sino da estação
badala uma vez, informando que o trem partiu de Mussuranga, e só vinte minutos
separa a sua angústia da sua ainda pretendida amada.
A “composição” parada, passageiros sobem,
passageiros descem, mas entre os que descem falta Rosa. Se desespera, enche os olhos de
água, se apressa para que ninguém perceba e vai sentar na rampa do curral de ferro. Depois de meia hora
sem saber no que pensar, levanta a cabeça, e vê uma miragem, Rosa, com a mesma
roupa que partiu, e de sacola na mão, estava à sua frente, passando sem
perceber o seu desespero. Loucura pura! Como se fosse de propósito, só para lhe
agoniar ela havia saltado do trem do lado oposto à plataforma, apenas achou
mais prático para seguir o seu caminho. Como não era miragem, se encheu de
alegria e desespero e achou que só existia aquele momento, não podia deixar
para amanhã. Pediu a Arlindo, seu amigo,
uma bicicleta emprestada, e pedalou forte ,tão forte que quase voa, parou no tamarineiro, lugar estratégico para aguardar Rosa e
declarar sua paixão. Ela não imaginava tudo que estava acontecendo no
coração de Jonas pôr sua culpa, e assim sendo, se aproximou tranqüilamente da fruteira
frondosa, quando então se deu a interrupção dos seus passos.
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