quinta-feira, 30 de agosto de 2007

Pobre Povo sem Heróis


Em o seu livro O Herói de Mil Faces, Joseph Campbell nos mostra que todos os mitos, contos de fadas e histórias folclóricas falam do herói, da eterna busca do homem por sua essência, em uma tentativa de se superar e se dar como exemplo aos seus iguais, tendo, naturalmente, por outro lado, o ser humano, comum mortal, a necessidade de se alimentar da fantasia da possibilidade de um dia se tornar também um herói.

Os homens, de um modo geral, têm ainda hoje uma necessidade de acreditar em forças mágicas, para poder explicar o que acontece em seu particular, na sua vida comezinha. Nesse sentido, os contos de fadas contemplam esta busca por serem responsáveis por responderem sugestivamente às questões internas da natureza humana, dando dimensão de extraordinário ao que é simples, pois a ânsia de se sentir amparado é fato histórico – do inconsciente coletivo-que sempre gera expectativa de apoio e proteção em momentos difíceis.

Ainda em nosso tempo, persiste a imagem da fada-madrinha como elemento mágico e de transcendência a condições melhores. Essa busca da madrinha (madrinha, etimologicamente, vem do latim matrina, diminutivo afetivo de mater, mãe), pode ser sintetizado por uma força, uma prece, uma religião, um indicativo qualquer de saída de uma situação difícil, com a força do “sobrenatural”. Vamos ver a força deste valor inconsciente simbolizado até em expressões como ser apadrinhado de alguém para conseguir algum benefício.

Lygia Nunes, em A Casa da Madrinha, representa, com muita propriedade, que a única solução para a pobreza é o sonho, sobretudo a fé nesse sonho, pois aí se espelha a possibilidade de se sair de uma situação de dor, onde tudo conspira contra, para uma realização onírica, para mitigar a dor de se viver sem esperança.

Ansiamos por um herói que venha renovar o mundo, ainda que seja o nosso mundo doméstico, podendo ser aquele político que se faz de igual, dizendo que “sente orgulho da mãe ter sido analfabeta”, claro que não é de se envergonhar, mas nenhum governante pode se dizer orgulhoso com analfabetismo de quem quer que seja, mesmo o da mãe, como recentemente aqui na Bahia o presidente Lula disse, desqualificando a educação e fazendo demagogia sobre as limitações dos que o ouviam.

É lamentável que o nosso povo sinta a necessidade de projetar os seus sonhos sobre pregações falaciosas de religiosos que buscam apenas o poder temporal de uma grande assembléia, valendo aí tudo para mostrar que ali, naquele culto, a força fará o desaparecimento de todas as suas dores, em processo alienador do que deveria ser incentivador para a luta, para a transformação pela educação e trabalho.

É lamentável que políticos se calquem na figura de projeção desta gente infeliz, fazendo-se o salvador de seus martírios, através de processos assistencialistas, fomentadores indiretos da compra de votos, mediante custeio da miséria com vales de tudo, até de esperança.

É lamentável que um povo vibre com um brasileiro que foi ao espaço, tendo pegado uma carona que valeu dez milhões de dólares, para nada fazer, enquanto por aqui a miséria continua crescendo.

É lamentável ainda continuar vendo esta gente querendo brilhar no sambódromo, desabafar nos estádios de futebol e chorar em seus casebres a miséria em que vive.

Texto elaborado por Prof. José Medrado. Diplomado em Letras Vernáculas pela Universidade Católica de Salvador, onde também cursou Filosofia. Professor da Escola de Magistratura Trabalhista, em Salvador - BA. Membro da Academia Brasileira de Ciências Mentais. Coordenador Geral do CEVIBA (Centro de Atendimento às Vítimas de Violência na Bahia). Idealizador e fundador da Cidade da Luz, em Salvador, Bahia.

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