sábado, 25 de outubro de 2008

Por que Lula acordou na crise

24/10/2008



Três motivos levaram o presidente Luiz Inácio Lula da Silva a acordar em relação à crise econômica internacional e os seus efeitos sobre o Brasil.

Na viagem internacional da semana passada, quando visitou cinco países em três continentes, Lula viu que a crise tinha atravessado não apenas o Atlântico, mas também o Índico e o Pacífico. Ou seja, era global mesmo.

Ouviu na Índia, segundo auxiliares, que o país já sentia efeitos na economia real. A Índia é um dos países emergentes que mais crescem no mundo. Na visita de um ano antes, Lula encontrara uma nação muito confiante no cenário econômico. O cenário agora é outro.

De volta ao Brasil, Lula teve contato com o segundo dos motivos que o fizeram abandonar o tom otimista e assumir uma avaliação pública mais realista.

O setor financeiro brasileiro fora vendido ao presidente como sólido, mas essa informação estava parcialmente incorreta. Ele ficou sabendo que há, sim, riscos pontuais. Medidas já adotadas pelo Banco Central haviam surtido pouco efeito. Pequenos bancos estavam sofrendo muito, e poderia sobrar até para instituição de grande porte.

Ou seja, confusão no sistema financeiro neste momento, quando o crédito começa a destravar, seria um tiro no pé do crescimento econômico do ano que vem.

O terceiro motivo tocou na alta popularidade. Empresas da chamada economia real fizeram chegar ao governo que poderiam viver fortes problemas no segundo semestre de 2009. Essas companhias empregam muita gente. Tudo o que Lula não deseja é uma onda de desemprego na virada de 2009 para 2010, seus dois últimos anos no poder. O petista espera deixar o Palácio do Planalto com boa avaliação e sonha eleger a ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, como sucessora.

Reunidos, os três motivos explicam a rápida edição da medida provisória 443, articulada no intervalo d e uma semana. Essa MP tem alcance mais amplo do que medidas adotadas em países ricos. O governo brasileiro não possui a munição dos EUA nem da Inglaterra, mas criou um instrumento legal que permite aos bancos oficiais se tornar sócios de qualquer empresa brasileira em dificuldade.

A MP 443 é uma medida pontual que vale por um pacote.

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Maré baixa e maré alta

A medida provisória 443 tem sido chamada de MP da estatização. Mas Lula foi bem claro. Se necessário, vai usar os bancos oficiais para comprar participação acionária de empresas, sobretudo da economia real. No entanto, deseja vender tais ações na maré alta e mostrar que usou dinheiro público de forma responsável.

Ressalva: eventuais compras do Banco do Brasil no setor financeiro que reforcem o cacife da instituição do ponto de vista estratégico poderão ser definitivas.

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Em ondas

Um integrante do governo Lula que participou das crises na administração FHC fez um alerta importante ao Palácio do Planalto. Crises internacionais acontecem em ondas. Por isso, o governo não deveria baixar a guarda e achar que o Brasil sofreria apenas uma marola.

Kennedy Alencar, 40, é colunista da Folha Online e repórter especial da Folha em Brasília. Escreve para Pensata às sextas e para a coluna Brasília Online, sobre os bastidores da política federal, aos domingos.Também é comentarista do telejornal "RedeTVNews", no ar de segunda a sábado às 21h10.

E-mail: kalencar@folhasp.com.br

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