terça-feira, 20 de novembro de 2012

ENQUANTO COLHIA AMORA


-"A minha casa tinha fogão a carvão. Tinha dispensa, tinha cristaleira, arca no quarto dos meus pais, roupas guardadas com um cheirinho bom de naftalina. A minha casa tinha cadeiras na sala, seis! e uma mesa de centro segurando três bisquís; uma dançarina, um elefante e um gatinho. Ainda na sala, sobre uma escrivaninha tinha um rádio ABC de 12  faixas.a alegria de meu pai. A minha casa tinha terreiro bem varrido, tinha quintal, mas. mais que tudo isso, a minha casa tinha, felicidade. Gostaria de dizer isso num palco do
tamanho do mundo... Do lado direito da minha casa, tinha uma casa velha, e do lado esquerdo bons vizinhos, meus tios e padrinhos.
Meu tio Zezé..., irmão de meu pai. Carpinteiro, desbrav ador das florestas, onde buscava a parceria da natureza para fabricar cangalhas, cancelas e ainda madeira grossa que transformava em tábuas, serradas com serras gigantes. Dia de ferrar as rodas do carro de boi, fogueira acesa, aro de ferro bem escondido embaixo da lenha até ficar vermelho como brasa. Alicates gigantes dançam no manejo, as rodas que tio Zezé fez, só faz esperar, os menino pegam água no rio, depois que o aro encaixar na roda, vem os ajustes com as marretas e aí é só jogar água para esfriar. E tome-la água e o vai e vem dos meninos só para quando o aro não solta mais fumaça.
No fundo da casa do meu tio Zezé, ficava sua
carpintaria, na sua ausência, quando ia para o mato, eu, Tonho, e Dí, meu primo, ficávamos a malinar nas ferramentas, tentando fazer um brinquedo qualquer. Meu irmão era o mestre, fabricava carrinhos, locomotivas e até torre para perfuração de petróleo. Que belas recordações!
Numa noite de lua cheia, sentei ao lado do meu tio, na porta da sua casa quando ele descansava, pitando o seu cigarro de palha, Havia uma claridade prateada sem, interrupções, vinda de um céu sem nuvens, completamente azul.
.                                                                       •
—Sabe Jonas. Numa noite assim, me dá vontade
de sair caminhando pelo campo, andar, andar, e quando cansasse me atirar num banco de areia branca e descansar sem pressa, talvez até o amanhecer.

Foram muitas as conversas, bate- papos, eu e meu tio tínhamos uma relação muito forte, ou era assim naqueles tempos ?. tios e sobrinhos, primos , avós e netos. Pais e filhos nem se fala. enfim todos eram muitos preciosos, a família era absoluta. Meu tio, as vezes cantarolava uma música, que nunca esqueci. Também nunca ouvi em rádio, nem mais ninguém cantar. Eu ficava bem quieto enquanto a voz dele flutuava e entrava na minha alma.

.....Lago azul,
     Indiferente assim
     o meu amor não vem
     não tem pena de mim

     Por que não vem
     por não saber amar
     a lua enamorar
     minha paixão sem fim....


                                                        ------Minha tia Silvina socava no pilão o café torrado  com rapadura, peneirava, peneirava, ágil alimentava  ofogo com lenha de primeira que logo virava "tissão".   As labaredas lambiam a chaleira e a água fervia. O pó fresquinho vai para o coador, e o caboré, um tipo de  bule de barro, acolhe o café “donzelo”, como ela chamava. Era um prazer diferente, e todos em volta saboreavam, como se outro igual só na próxima torrada. Minha tia dizia, que o café da lata era gostoso, mas não como saído do pilão.
                                       0s pensamentos de Jonas dão um pulo, não saem do  Vale do Ararí, o dos seus 12 anos para os 16, vai
                           Ao encontro de Rosa, resolver de uma vez o seu romance, acabar de vez com os comentários.
                            Era inevitável, Seo Juca ficou sabendo de tudo e D. Regina com aquele seu jeito de não deixar coisa alguma virar problema ficou no meio, assumiu o comando da situação. Conversava com o marido na sala , quando pela janela viu Rosa passando rapidamente. Apressou-se para  o terreiro, deparando com Jonas encostando sua bicicleta no tronco do jenipapeiro. Ele não sabia onde tinha encontrado tanta coragem, facilitava sua vida o temperamento de Seo Juca que logo apareceu coçando a barba e com um sorriso amistoso e sem esperar por Jonas foi logo dizendo:
                                   ------Se tá querendo falar comigo, tamo empatado, eu também quero falar com você.

                                          Jonas se aproximou dos assentos de troncos de coqueiro, arrumados no chão varrido na sombra da jaqueira grande. 
                                   ------Germano pilheriou comigo no pé do balcão de Turíbio, levando na brincadeira esse negócio do seu namoro com Rosinha, falando que era para eu engordar porco, peru,  como se vocês já tivesse pra se casar. Não dei ouvido, já sei como é esse  povo. Vocês são duas crianças e não deviam já ta pensando nessas coisas, mas  já que se acertaram só vou recomendar...abrir os olhos de vocês. Primeiro: só pode se ver pelo dia, pela noite nem eu deixo Rosinha no meio da escuridão e nem você  é esse home todo, pra atravessar  pinguela no escuro, nem passar por baixo do pé de biriba malassombrado como ele é.
Jonas estava aliviado, nem precisou falar, pedir para namorar com Rosa, mas também não gostou nada de ser chamado de criança. Seo Juca só faltou dizer que ainda fedia a mijo, ou que tinha acabado de sair das fraldas. D. Regina só observava, e Juca foi mais adiante.
                                     ------Rosinha estuda de manhã e dia de farinhada ta ocupada o dia todo, é melhor regular esse namoro para os fim de semana. Vamo ver até onde vai essa brincadeira de vocês.

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